Medo de voar

JB- Medo de voar

Terça-feira, 9 de maio de 2000

JORNAL DO BRASIL

Medo de voar

Quase um século depois da proeza de Santos Dumont, em Paris, a situação dos inventores brasileiros não evoluiu em nada. É o que se demonstra com a aventura do inventor Reginaldo Marinho que, não reconhecido no Brasil, conquistou em Genebra medalha de ouro no Salão Internacional de Invenções da Europa, obteve apoio financeiro para trabalhar na Suíça e propostas de quatro empresas europeias para transformar em tecnologia seu método revolucionário de construção celular.

O método de Reginaldo propõe estruturas de plástico como alternativa econômica e racional para construções, conforme se viu na reportagem publicada domingo no JORNAL DO BRASIL. Assim, poderão ser construídos edifícios, casas e instalações esportivas e industriais sem as estruturas até aqui usadas em todo o mundo: as convencionais estruturas metálicas, de cimento armado ou de madeira. As estruturas de plástico propostas por ele seriam alternativa mais econômica e racional, evitando desperdício de material. Levam-se para a obra só as peças que serão utilizadas. Como exemplo, armazéns, silos, hangares, ginásios, edifícios e casas populares custariam 30% a menos que as construções com estruturas convencionais.

O inventor, agora bafejado pela compreensão europeia, falou com ressentimento sobre as tentativas de viabilizar sua invenção no Brasil, onde, de acordo com citação de Osvaldo Aranha, “nada se cria e tudo se copia”. De fato, nos últimos cinco anos, o Brasil aumentou oito vezes os gastos com importação de tecnologia. Há, no Brasil, segundo Reginaldo, milhares de pesquisadores e inventores em atividade, isolados, sem apoio governamental, “financiando-se com os próprios recursos”. Muitas descobertas e invenções brasileiras são expropriadas e exploradas indevidamente por empresas e grupos internacionais, sem reação de protesto.

Cita-se como exemplo a invenção do bina, instrumento identificador de chamados, encontrado nos telefones celulares e convencionais, movimentando 8 bilhões de dólares em todo mundo. Pois o bina, segundo lembra Reginaldo, foi descoberto, produzido e patenteado no Brasil por Nélio Nicolai, inventor brasileiro, vítima da falta de organismos preparados para proteger a patente nacional.

A situação histórica de Santos Dumont pelo menos progrediu em alguma coisa, agora que um historiador americano, Paul Hoffman, mergulhado na redação de uma biografia definitiva (Asas de loucura), poderá concluir, se for o caso, pela primazia de sua aventura sobre a dos irmãos Wright. Pelo menos, admite o americano, por enquanto as pesquisas apontam Santos Dumont como o primeiro a voar em público.

Em matéria de invenções, os brasileiros ainda têm medo de voar.

VColor Medo de voar

Link para o editorial Medo de voar da hemeroteca digital da Biblioteca Nacional.

Além do medo de voar, o sistema brasileiro impede quem pode voar. Os que tentaram foram massacrados. Padre Landell de Moura, inventou o rádio, mas foi impedido de continuar com as suas demonstrações; o Padre Azevedo inventou a máquina de escrever, mas não pode exibi-la na Exposição de Londres; Alberto Santos Dumont foi bombardeado pelos irmãos Wright, que impuseram o falso pioneirismo, que agora se revela.
Em outubro de 1997, eu vi ao vivo, o discurso do presidente dos Estados Unidos Bill Clinton, no Palácio do Itamaraty, no qual ele reconheceu que o brasileiro Alberto Santos Dumont é o “pai da aviação”.
No dia seguinte, eu pesquisei em todos os veículos de comunicação do Brasil e não encontrei nenhum comentário sobre o valioso e inesperado cometário do presidente dos Estados Unidos.
O silêncio da imprensa confirma a sabotagem generalizada. Então, eu fui ao site da Casa Branca e fiz o download do discurso para comprovar a maldade que fazem contra os talentos brasileiros.


Um apelo à ação

Mesmo após 25 anos de boicotes, sabotagens e promessas não cumpridas, o Construcell permanece à frente de seu tempo. Ele não é apenas uma tecnologia brasileira; é uma contribuição potencial para resolver problemas globais.

Convido todos os leitores, instituições e líderes a refletirem sobre a necessidade de romper com sistemas que impedem o progresso e a abraçar inovações que podem transformar vidas e proteger o meio ambiente. O Brasil ainda pode assumir um papel de destaque no cenário mundial — basta acreditarmos e agirmos.

Em 09/05/2000, o Jornal do Brasil publicou o editorial “Medo de voar” analisando e endossando as críticas ao “modelo de desenvolvimento” vigente no Brasil que sabota as tecnologias nacionais, que apresentei na reportagem “Um inventor brasileiro para o mundo” publicada no domingo anterior no mesmo veículo. O que foi escrito há quase vinte e cinco anos continua absolutamente atual. Temos a necessidade urgente de mudar essa atitude nefasta contra a própria Nação. Em seguida, veja a publicação da transcrição do editorial “Medo de voar” e da reportagem “Um inventor brasileiro para o mundo”. Junto a cada publicação eu adiciono o link da hemeroteca digital da Biblioteca Nacional contendo o respectivo conteúdo.

Infelizmente, quando estava em Genebra, eu fiz a escolha errada e preferi ir para a Itália, mas quando fiz os contatos com os empresários, sempre após muitas reuniões, eles diziam mais ou menos assim: “Você não teve apoio de seu país, dê isso para nós, que desenvolveremos aqui.” Após muitas tentativas, revoltado, voltei para o Brasil para tentar mudar esse jogo perverso. Escrevi muitos artigos denunciando esse cenário maléfico, alguns deles para o Jornal da Ciência, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC e nada mudou. Tentarei encontrar algum, que certamente continua atual e publicarei aqui.
Depois de tantos anos , vejo que perdi o jogo, mas eu não gostaria de ser quem me derrotou. Foi um jogo sujo. Quero jogar uma nova partida, com outro time. Para mudar o Brasil precisamos de um esforço coletivo. Todos juntos.

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